A bronca da Mãe Natureza

Editoria: Vininha F. Carvalho 08/04/2005

As mudanças no clima estão cada vez mais violentas e, de acordo com os climatologistas mais respeitados, são mais resultado da mão do homem do que de caprichos naturais, como erupção de vulcões etc. Ou seja, nas inesquecíveis palavras da música "Mamãe Natureza", de Rita Lee, "a mamãe não dá Sobremesa".

E é exatamente o que ocorre atualmente: o mundo paga o preço pelo abuso e crimes cometidos contra o meio ambiente em mais de um século de Revolução Industrial, com a queima indiscriminada e descuidada de carvão e petróleo, e isto ainda não fez com que se desista de explorar o planeta de forma predatória.

Como resultado de mais de um século de queima de combustíveis fósseis, o clima do planeta parece ter enlouquecido. A Europa amarga a sua maior onda de calor desde que se começou a registrar as temperaturas, com prejuízo estimado acima de US$ 16 bilhões. Os números da França são os mais impressionantes ,superam a casa de 10 mil mortos, principalmente na população da terceira idade, vítima de desidratação.

Os demais países europeus também têm perdas humanas para contar. Portugal, com mais de 200 mil hectares de florestas devastados por incêndios, tem mais de 1.300 mortes. A Holanda, de clima mais ameno, apresenta 500 óbitos. Em todos os países o quadro é de seca, com prejuízos nas lavouras na Inglaterra, Itália e Alemanha. A Suíça, por exemplo, começa a tomar consciência que as "neves eternas dos Alpes" não são tão eternas assim: temperaturas em torno de 30 graus causam o derretimento em picos com mais de 2 mil metros de altitude, provocando deslizamentos e avalanches.

Do outro lado do Atlântico, o quadro não chega a ser tão preocupante, mas o ar já está pesado com a fumaça do fogo nas florestas no Canadá. Os Estados Unidos, que se recusam a assinar o Protocolo de Kyoto para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa, têm suas lavouras de soja prejudicadas pela seca, além de incêndios florestais com o dobro do tamanho normal. O calor excessivo ainda atinge o outro lado do mundo, com a Índia registrando temperaturas de 49 graus.

De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM), 2003 pode se tornar o ano mais quente na história do planeta, desde que as medições começaram em 1860, superando o recorde de 1998.

Alertas não faltaram e políticas, como o conceito de desenvolvimento sustentável, surgiram. Veio o Protocolo de Kyoto, seguido por um tímido, mas promissor, mercado de negociação de créditos de carbono, amparado por uma consciência ambiental que se fortalece a cada dia. Porém, tudo isto ainda não se impôs como um novo comportamento, não se consolidando em novos paradigmas.

O fato de o Brasil estar passando sem maiores dissabores por essa onda de calor não significa que devemos nos descuidar. É fato que contamos com pontos altamente positivos, como uma das matrizes energéticas mais limpas do planeta, baseada na hidroeletricidade e no uso do álcool de cana como combustível, reduzindo a emissão de vários gases causadores do efeito estufa, tendência que pode ganhar fôlego com a futura adoção do biodiesel.

Como coordenador da Frente Parlamentar pela Energia Limpa e Renovável na Assembléia Legislativa paulista, tenho razões de me orgulhar dos projetos que reduzem a participação dos combustíveis fósseis na nossa vida.

Que o Brasil sirva de exemplo de desenvolvimento limpo, mas guarde na memória que a mudança climática é um fenômeno mundial e que o aquecimento da terra pode provocar catástrofes naturais de grande porte, além de levar doenças, como a malária, a áreas onde só chegavam por avião. Por isso, além de manter e aprofundar esta matriz energética limpa, devemos buscar salientar e ampliar o aspecto renovável.

E, principalmente, agir no contexto internacional, nos Fóruns supranacionais, para que este compromisso prevaleça. Assim, como feito em Johannesburgo 2002, a defesa da meta de 10% de fontes renováveis nas matrizes energéticas deve continuar. É bom lembrar que a Mãe Natureza tem muitos outros filhos além do ser humano para cuidar e pode se tornar, como agora, bem rigorosa em relação aos que prejudicam a todos.

Fonte: ARNALDO JARDIM -deputado estadual-SP