O canarinho voltou!

Editoria: Vininha F. Carvalho 11/07/2012

Dizem que a gente deixa a roça, mas a roça não deixa a gente. Nasci e passei minha primeira infância no sítio. A casa ficava perto de um pasto e tinha um belo pomar na porta da cozinha, muito comum na época. Logo de manhã, uma das diversões era espantar os canários da terra que alegravam a paisagem com seu canto. Outro passatempo era caçá-los (naquele tempo não era crime, nem politicamente incorreto) para que, na gaiola, cantassem por mais tempo e mais perto. Bons tempos.

Fui crescendo e, já na cidade, estudando. Mas as tardes ainda eram passadas no sítio. Depois, a agronomia, os novos amigos, a nova vida e os novos horizontes.

Novas técnicas aprendidas e empregadas. A agricultura mundial e a brasileira se modificavam a uma velocidade incrível. Novas espécies cultivadas, como a soja, invadiam os campos paulistas.

O café e o algodão se deslocavam para o Paraná. Novas máquinas eram desenvolvidas, gente deixando o campo, cidades inchando. E a agricultura crescendo, produzindo alimentos cada vez mais baratos, mais acessíveis à população.

O uso de sementes melhoradas aumentava, a calagem deu grande impulso às produtividades, os fertilizantes contribuíram muito para que tudo acontecesse.

Com o desenvolvimento acelerado, com o aumento das lavouras, com o uso de cultivares mais uniformes e mais produtivos, também foi acentuado o problema com pragas e doenças das culturas. Novas tecnologias e novos defensivos eram desenvolvidos e utilizados. E eu crescendo, estudando, aprendendo, trabalhando e ainda visitando o sítio.

Mas começava a perceber algo muito triste. Estava desaparecendo uma das boas memórias de minha infância: os canários da terra estavam sumindo. Desaparecendo mesmo. Também me afastei um pouco do sítio, por imposições da vida. Por um bom tempo.

Terminava então uma era na agricultura. Foi descoberto que os defensivos utilizados à época, se viabilizavam a produção de alimentos e matéria prima cada vez mais baratas, também agrediam os rios, as matas e a fauna.

A situação não era sustentável. A sociedade cobrou, a indústria mudou seu rumo e assim também foi com os produtores rurais. Começava então uma nova era na agricultura. Novas exigências, novos produtos, novas técnicas.

O manejo integrado de pragas, racional e econômico, se tornou realidade. Aprendemos a usar o cerrado, antes pária da natureza. Reaprendemos a produzir lavouras, carne e leite nas mesmas áreas, com a Integração Lavoura Pecuária.

Aprendemos a fazer semeadura direta, mitigando a emissão de gases de efeito estufa. Desenvolvemos agrocombustíveis, como o etanol e o biodiesel, melhorando nossa matriz energética. E nossa agricultura cada vez mais competitiva, gerando empregos, divisas, alimentos, matérias primas, energia e sustentando esse país. Suportando o crescimento de nossas cidades. E, agora, também preservando a natureza.

Quis o destino que eu, agora, depois de quase uma vida vivida, depois de ter aprendido muito mais que ensinado, passasse mais tempo no sítio, novamente. Com um pouco de tempo para contemplação do pasto, do pomar e, surpresa, dos canarinhos da terra! O canarinho voltou. Canta novamente no pasto, no pomar. E nossa agricultura cada vez mais produtiva, sustentando esse país.

Feliz de quem pode assistir, depois de sua quase extinção, o retorno dos canários. Feliz de quem pode perceber a evolução de nosso conhecimento resultando no uso racional de produtos menos agressivos à natureza, no desenvolvimento de técnicas para uma agricultura competitiva, econômica e sustentável em favor da vida. Bons tempos!


Sobre o CCAS:

Conselho Científico para Agricultura Sustentável- CCAS é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011,com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados a sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara,sobre o assunto.

O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico.

Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas.

A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade.

É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade.

É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa sejam colocados a disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça.



Fonte: Ciro Antonio Rosolem, Professor Titular, Faculdade de Ciências Agronômicas, UNESP, Botucatu, membro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável