Lixo urbano: energia renovável em potencial

Editoria: Vininha F. Carvalho 04/04/2011

Em 2010 foram promulgados a Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei 12.305/2010, e seu Decreto regulamentador, Decreto nº. 7.404/10, os quais tratam do gerenciamento de resíduos sólidos no país, e inovam quanto às responsabilidades dos geradores de resíduos e do Poder Público.

Dentre outros objetivos, a Política Nacional de Resíduos Sólidos pretende o fim dos lixões, verdadeiros vetores de doenças epidêmicas e degradadores da qualidade ambiental, haja vista que a disposição irregular de resíduos sólidos, ainda que orgânicos, pode acarretar em danos irreversíveis ao meio ambiente, com, inclusive, a contaminação do lençol freático.

Os chamados lixões surgiram especialmente ao redor dos grandes centros, em razão do descaso do Poder Público quanto à destinação dos resíduos urbanos.

O crescimento desordenado, sem um Plano Diretor Municipal e uma política de gerenciamento desses resíduos, agravou consideravelmente o problema com o passar do tempo.

Isso porque lixão é uma área em que os resíduos sólidos são descartados livremente a céu aberto, onde não há planos ou projetos que impeçam conseqüências sociais ou ambientais negativas.

Foi, então, nesse contexto e diante da exclusão social de classes economicamente desfavorecidas que surgiu a atividade de catador de lixo, atividade essa responsável, atualmente, pelo sustento de centenas de famílias.

Tal atividade, tamanha sua relevância, foi incluída dentre os objetivos da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que visa a integração dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis nas ações que envolvam a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, incentivando a criação e o desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis.

O documentário “Lixo extraordinário” de Vik Muniz, retrata bem a realidade, internacionalmente conhecida e divulgada após a indicação do documentário para concorrer ao Oscar na categoria de melhor documentário.

Seja pela arte, seja pela realidade social do país, seja pela necessidade de proteção do meio ambiente, considerado um direito difuso, fato é que a questão do lixo urbano, com suas desastrosas conseqüências sociais e ambientais, é hoje assunto em voga e demanda peculiar atenção de toda sociedade.

Como solução para o problema dos lixões, a alternativa ambientalmente adequada é a implantação de aterros sanitários. No entanto, infelizmente ainda há muita resistência social para a criação de aterros, que comumente são confundidos com lixões ou aterros controlados.

Pela Lei nº. 12.305/10, a destinação dos resíduos sólidos para aterros sanitários é considerada como disposição final ambientalmente adequada. Isso porque, no caso dos aterros sanitários não há contaminação do solo ou a proliferação de vetores de doenças epidêmicas, sendo os impactos ambientais mitigados.

Assim, com o intuito de aumentar os benefícios ambientais e reduzir os impactos negativos da destinação dos resíduos sólidos, a Política Nacional do Meio Ambiente previu a elaboração de Planos de Resíduos, nas três esferas da Federação.

Nesse particular, a União deverá elaborar, sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente, o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, a ser atualizado a cada quatro anos, com metas para eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis. Por sua vez, Estados e Municípios também são obrigados a instituir uma Política de Resíduos.

O Decreto nº. 7.404/10, que regulamenta a Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, determinou que os Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos deverão identificar e indicar medidas saneadoras para passivos ambientais originados, entre outros, de áreas contaminadas, incluindo-se lixões e aterros controlados, em uma clara tentativa de aniquilar as formas irregulares de destinação dos resíduos.

A criação de aterros sanitários mitiga os danos ambientais, haja vista que os aterros são construídos com tecnologias específicas de tratamento dos resíduos, de forma a evitar a contaminação do solo, tratando-se o chorume – efluente líquido do lixo, e é uma forma de captação do biogás, fonte de energia decorrente da decomposição dos resíduos orgânicos, que passam por um processo anaeróbio.

Deste modo, através da cobertura do local onde é descarregado o lixo orgânico é possível a captação de gás e o bloqueio de sua emissão para a atmosfera, o que contribui no combate ao aumento das emissões de gases causadores do efeito estufa.

A preocupação com as mudanças climáticas e redução de emissões, permite que, através de projetos de MDL – Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, os aterros sanitários adquiram créditos de carbono negociáveis. Saliente-se que a simples queima do gás, por si só, pode gerar créditos de carbono comerciáveis, pois com a queima do gás metano, principal componente do biogás, esse é transformado em vapor d’água e CO2, sendo o CO2 consideravelmente menos poluente que o metano.

Inclusive, o gás produzido pela decomposição dos resíduos orgânicos, uma vez captado, poderá ser fonte de geração de energia em razão de seu elevado valor calorífero.

Tal tecnologia ainda é consideravelmente custosa, mas pode ser uma saída interessante para o déficit energético do país unido à urgente necessidade de solução para a destinação dos resíduos sólidos urbanos.

Nesse contexto, então, poderá surgir o aproveitamento energético dos resíduos orgânicos. Ora, o déficit energético do país demanda investimentos na produção de energia, produção essa que, através da utilização do gás produzido pela decomposição dos resíduos orgânicos, terá ganhos consideráveis, não só através de créditos de carbono, mas, também, com geração de energia de fonte renovável.

Em conclusão, os potenciais energéticos do setor não devem ser desconsiderados por investidores, principalmente quando o tema mudanças climáticas aparece como verdadeira vedete das pautas de reuniões internacionais.



Fonte: Patricia Guimarães é advogada associada da área ambiental do escritório Doria, Jacobina, Rosado e Gondinho Advogados Associados.