O caminho certo para o agronegócio

Editoria: Vininha F. Carvalho 15/01/2009

A solução do gargalo da infra-estrutura de transportes e a elaboração de uma política nacional eficaz para o agronegócio, duas prioridades do Brasil, têm um ponto de congruência um tanto esquecido nas abordagens dos temas: as estradas vicinais e rurais.

Concentrar investimentos apenas em grandes rodovias, embora estas sejam imprescindíveis, é um erro estratégico — infelizmente verificado nos programas federais e de vários estados.

São Paulo, embora de maneira intermitente, tem sido exceção na equivocada regra, desde que André Franco Montoro, governador entre 1983 e 1987, empreendeu, há 25 anos, vigoroso programa de construção, melhoria e pavimentação de vicinais e rurais.

Dentre os preciosos legados do saudoso político estão 5.300 quilômetros dessas vias. Foi um investimento fundamental para que o Estado tivesse, hoje, 12 mil quilômetros dessas estradas, que integram a maior e melhor malha viária pavimentada do País, juntamente com 22 mil quilômetros de rodovias estaduais e mil federais.

O aprofundamento dessa ação estratégica para a agropecuária compõe outra consistente herança política do governador Mário Covas. Em sua gestão, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento realizou o Projeto Melhor Caminho.

Com essa iniciativa, operacionalizada pela Companhia de Desenvolvimento Agrícola do Estado de São Paulo (Codasp), efetuaram-se obras em 3,22 mil quilômetros de estradas rurais, em 557 municípios, abrangendo algo próximo de 17 mil propriedades.

Visão histórica é mesmo a principal marca dos estadistas, pois a realidade presente mostra serem imprescindíveis estradas de qualidade e seguras entre o meio rural, os centros de consumo, industrialização, distribuição e exportação.

Outro dado realça a importância das vicinais: a despeito de apenas 4% da população paulista viverem no campo, em 83% das cidades do Estado é grande o contingente de trabalhadores que residem no perímetro urbano, mas trabalham no meio rural.

Assim, as vias locais também desempenham elevada função social, pois ir e vir, inclusive para escolas, hospitais, centros de saúde, pólos de lazer e cultura, constituem um dos direitos básicos da cidadania.

Na agropecuária, de maneira específica, a boa estrada rural resulta em redução de custos, ao facilitar o acesso a insumos, serviços especializados e escoamento da safra. Também reduz perdas, ao agilizar o acesso a armazéns, secadores, agroindústrias e packing-houses.

Além disso, a má conservação das vias está entre as mais graves causas da degradação ambiental, devido ao assoreamento de rios e mananciais e à deterioração de áreas lindeiras. Sem falar, ainda, da segurança para transitar.

Os mais renitentes, ante todos esses irrefutáveis argumentos, replicam com as letras do marco legal: “A manutenção da infra-estrutura de estradas vicinais e rurais é atribuição dos municípios”. É verdade, mas a maioria das prefeituras brasileiras, inclusive as paulistas, consumiria parcela muito elevada e desproporcional de seu orçamento se tivesse de assumir integralmente esse encargo.

Ainda bem, portanto, que a lei não proíbe União e estados de investirem nessas obras. Basta vontade política! Prova disso são duas ações estratégicas atuais do Governo de São Paulo.

Uma delas é o Programa de Recuperação de Estradas Vicinais (Pró-Vicinais), iniciado em junho de 2007, cuja primeira fase alcançou 2,1 mil quilômetros de 152 vias, em 199 municípios.

A segunda fase prevê investimentos na recuperação de mais 2,4 mil quilômetros de 198 estradas, em 238 cidades. O total é de 4,5 mil quilômetros.

A outra ação, uma prioridade da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, é justamente a retomada do Projeto Melhor Caminho, de melhorias em estradas rurais, para regularizar seus leitos e conservar o solo, incluindo o direcionamento das águas pluviais ao lençol freático.

Assim, evitam-se erosões e se impede que terras férteis percam-se, assoreiem e poluam rios e mananciais com agrotóxicos. No Plano Plurianual do governo paulista para o período 2008-2011, essas obras inserem-se no Programa de Infra-Estrutura e Logística para os Agronegócios, cuja meta alcança 8,4 mil quilômetros.

Além de prover investimentos, o Estado precisa estabelecer política articulada para as estradas rurais e vicinais, cuja gestão não pode ficar limitada a cada município. É necessário pensá-las como parte de um sistema constituído também por grandes rodovias, ferrovia e hidrovia.

Uma das principais vantagens competitivas da agropecuária paulista está na retomada dessa concepção. Trata-se de uma referência que não pode mais ser esquecida na gênese de uma política nacional de fato eficaz para o agronegócio e, claro, também para o transporte.



Autoria: João Sampaio, economista, é secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo e presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável (Consea).