Meio Ambiente: Quanto tempo ainda temos?

Editoria: Vininha F. Carvalho 20/06/2007

Em 5 de junho, foi comemorado o Dia do Meio Ambiente. Pelo simples fato de ser lembrado para um dia de reflexões, a Terra agradece. A rigor, desde a elaboração do Relatório Brundtland há aproximadamente 20 anos (a partir dos trabalhos da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, instituída no âmbito da ONU), a questão ambiental vem sendo objeto, pelo menos, de análises e debates por parte das autoridades internacionais.

Entretanto, muitas pessoas, dentre as quais me incluo, permanecem pessimistas em relação às medidas concretas que estamos adotando na direção de um desenvolvimento sustentável global, que satisfaz as demandas sócio-econômicas do presente sem prejudicar as necessidades das gerações futuras. Porque?

Ainda falta-nos conhecimento suficiente para melhor avaliar a situação, pois, por mais informação que dispomos, nem sempre ela é suficiente para estimar a dimensão dos danos que estamos causando a nós mesmos. Temos uma única certeza: no ritmo atual, nosso planeta, e a vida nele contida, estarão comprometidos num futuro próximo.

Porém, se não fomos capazes, até o momento, por exemplo, nem mesmo de dimensionar adequadamente os riscos e os impactos gerados pelas nossas atitudes sobre o aquecimento global (apesar dos esforços do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU), como seríamos competentes a ponto de propor soluções tempestivas e eficazes sem uma mudança comportamental?

A mudança de comportamento abrange não somente a procura por soluções remediadoras ao processo de degradação ambiental, mas também procura atacar as causas dessa degradação. A adoção exclusiva de medidas remediadoras significa a manutenção do status quo, de taxas de crescimento econômico sustentado que geram, em troca, mais empregos e renda. As taxas sustentadas (e não sustentáveis), são aquelas que se mantêm ao longo do tempo, retratando o sucesso de uma sociedade que não deseja retroceder o crescimento da renda.

Seria ótimo, se não tivéssemos que deparar com uma questão crucial: pode ser mantido o atual paradigma de crescimento sem lastro nos fatores de produção providos pelo meio ambiente? Começamos, aqui, o estudo das causas: se a utilização de recursos naturais é acelerada, isso se deve, principalmente, ao aumento da população e à subavaliação dos bens e serviços ambientais.

Em um cenário de aumento populacional, políticas de controle de natalidade representam uma necessidade. Mas quando podem ser obtidos resultados concretos a partir dessas políticas? Seriam necessárias várias gerações para obter os primeiros resultados eficazes, considerando, inclusive, que as questões ligadas às políticas de controle da natalidade e planejamento familiar podem esbarrar em conceitos e paradigmas éticos, morais e religiosos. De qualquer forma, reduzir a população pouco adianta caso não se mude a relação com o meio ambiente.

Relativamente ao outro fator citado, como justificar a desvalorização de bens e serviços ambientais, mesmo em face da escassez cada vez mais perceptível? De fato, a escassez de recursos naturais é consequência que pode ser percebida há algum tempo já por alguns economistas.

A grande maioria desses, por outro lado, entende que o desenvolvimento tecnológico seria a base para criação de alternativas ao aumento do consumo.

Para exemplificar, a Revolução Verde , iniciada na década de 50, permitiu que o aumento global na demanda por alimentos fosse compensado pelo surgimento de novas técnicas de produção que impingiram ao solo maior produtividade por área.

Em tese, podemos produzir, atualmente, alimentos em larga escala no País observando as melhores técnicas de conservação do solo e de manejo integrado de pragas agrícolas, sem prejuízo do cumprimento, no País, da legislação ambiental que requer a preservação de áreas de proteção permanente, e o manejo sustentável de outras áreas de conservação.

Então, como o pouco valor que damos aos recursos naturais impacta, de fato, o processo de degradação? A ciência, ao criar soluções, também gera novos problemas, que interferem na capacidade de suporte ou resiliência de nossos recursos naturais. A mesma Revolução Verde, à época de sua implantação, não contava com os impactos negativos ao meio ambiente decorrentes do uso de agroquímicos.

Além disso, não obstante a ferramenta tecnológica estar em constante aprimoramento, nem sempre ela é disponível a todos, pois a informação é assimétrica. A disseminação de novas tecnologias é um processo lento e difícil, em especial em ambientes onde problemas sociais, econômicos e educacionais são notórios.

Ademais, os recursos naturais, por suas características, são bens públicos, e tal percepção desestimula um tratamento diferenciado pelos agentes econômicos, tal como um bem privado. Pode-se produzir a custos menores com a expectativa de que outro agente, ou mesmo o Governo, fornecerá as condições para a reposição, o que nem sempre ocorre. A esse espírito do "caroneiro de boas práticas", soma-se também o fato de que não há qualquer garantia de que a legislação ambiental seja eficaz ou será observada por todos.

Com efeito, fiscalizar o cumprimento à lei é uma medida extremamente dispendiosa ao Estado, por dois motivos em especial: em primeiro lugar, é notória a carência de recursos para tanto; em segundo, a própria legislação é tratada como uma imposição, uma despesa, fato que incentiva seu descumprimento, principalmente pela deficiência do poder coercitivo do Estado. Aliás, as exigências legais, em muitos casos, geram à sociedade um ônus desproporcional aos benefícios esperados.

Ante esse cenário, a mudança comportamental decorreria do reconhecimento do valor de bens e serviços que estão sendo sistematicamente dilapidados. Tal mudança é tardia em vista do caos, ou pode ser incentivada o quanto antes, de forma que, em termos econômicos, os custos de produção limpa sejam compensados pelo valor do bem ou serviço final. Onerando-se a oferta, racionaliza-se a demanda.

Não tenho a pretensão de ser conclusivo a respeito do tema, mas a valorização dos recursos ambientais dependeria da ação de políticas públicas e da mobilização da sociedade em geral. Quando as empresas poluidoras que esgotam os recursos naturais de forma insustentável vão incorporar em seus sistemas de produção os custos que impõem à sociedade? Enquanto as empresas multinacionais do petróleo, por exemplo, não forem obrigadas a pagar pelos impactos ambientais por elas provocados, o carro movido a fontes alternativas de energia permanecerá caro relativamente àquele movido a diesel ou gasolina, razão pela qual esse último ainda deve ter uma sobrevida de décadas até o momento em que o custo de extração de petróleo se torne proibitivo.

Aliás, incentivos econômicos representam o alicerce sobre o qual transitam os signatários do Protocolo de Kyoto, sem muita convicção, porém. O custo do crédito de carbono ainda é irrisório, e o controle desejado de emissões ainda está aquém do necessário para qualquer política de mitigação dos efeitos do aquecimento global.

E quanto a nós, será que exigimos práticas ambientalmente corretas? Sim, em algumas situações, tendo em vista o sucesso de alguns produtos de rótulos verdes ou ambientalmente amigáveis, o que vem forçando empresas a tratar a responsabilidade ambiental como investimento e oportunidade de negócios, e não como despesa. Em outros casos, não, pelo desconhecimento dos sistemas de produção empregados, ou, principalmente, pelo nosso desinteresse em arcar com os custos envolvidos no processo de sustentabilidade. Sabemos, por exemplo, que a água está se tornando escasssa. Quem quer pagar mais por ela ou pelo manejo dos mananciais e olhos dágua? Reconhecer a escassez de um bem ou serviço significa a possibilidade de abrir mão dele em determinadas ocasiões, o que reduz o conforto da sociedade.

A educação ambiental é elemento importante nesse processo, porém os resultados nem sempre geram uma nova cultura, mas, eventualmente, modismos. De fato, não se exige qualquer "enforcement" que obrigue o indivíduo a mudar seu comportamento com base em campanhas populares ou matérias curriculares nas escolas.

Para que seja encarada como uma política séria, a educação ambiental não pode ser tratada como uma disciplina marginal, de caráter meramente informativo, mas sim como uma prática de múltiplos objetivos, educando a capacidade crítica, espírito de iniciativa e senso de responsabilidade das pessoas. Ou seja, a adoção desse instrumento de persuasão equivaleria a uma educação política, por meio da qual reinvidicar-se-ia justiça e cidadania, presente a ética nas relações sociais com a natureza. Assim, pela complexidade das questões a que se dirige, a educação ambiental não promove mudanças a curto prazo.

Essa mudança comportamental gera inibição ao crescimento econômico? Desemprego? Ora, a utilização desse argumento faria corar qualquer um que defenda a inovação tecnológica como alternativa para o desenvolvimento sustentado. A incorporação de externalidades aos modelos econômicos tende a gerar deslocamentos na curva de oferta de novos produtos e serviços, notadamente aqueles relacionados à produção com respeito aos valores sócio-ambientais, como a indústria da reciclagem, que gera sinergias à economia como um todo. Essa nova perspectiva pode gerar novas oportunidades de negócios e crescimento econômico - desta vez, realmente sustentável.

Assim, entendo que a geração de valor aos recursos naturais seria, a curto prazo, o ponto mais importante a ser ressaltado, não obstante outras questões colocadas, como o planejamento familiar e a educação ambiental.

No entanto, a dificuldade em conferir valor aos recursos naturais e penalidades às empresas poluidoras é conseqüência direta de nossa ignorância sobre os efeitos das ações degradatória e poluidora.

Além disso, a mudança de comportamento nesse sentido exige iniciativas sociais e políticas, as quais muitas vezes confundem-se com interesses pessoais ou setoriais. Quanto tempo ainda temos? Na dúvida, devemos ser prudentes. Caso contrário, perderemos não apenas tempo, mas também chances para construir um futuro melhor para nossa geração, e para a de nossos filhos.


Autoria : Rodrigo Pereira Porto - Assessor do Banco Central do Brasil, especialista em Finanças pelo IBMEC, Mestrando em Gestão Econômica do Meio Ambiente pela Unb/CEEMA
rodrigo.porto@bcb.gov.br

Fonte: BECE-REBIA